26 Junho 2024, Quarta-feira

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Francisco Jesus:”Os equipamentos culturais que temos são insuficientes”

Francisco Jesus:”Os equipamentos culturais que temos são insuficientes”

Francisco Jesus:”Os equipamentos culturais que temos são insuficientes”

Futuro passa pela criação de auditório, pólo da biblioteca municipal e dois espaços para as artes e para a juventude na freguesia da Quinta do Conde

 

Falar de cultura em Sesimbra é não só tocar na programação, como é também abordar o “valioso património do concelho”, a “sua preservação” e “disponibilização ao público”, sem esquecer os equipamentos culturais, que “começam a ser insufi cientes”, e a “recuperação e preservação das tradições e identidade do município”. Assim o entende Francisco Jesus,
presidente da Câmara Municipal, que faz um balanço à estratégia que o município tem procurado seguir ao nível da cultura, que passa também pela oferta de um programa de
espectáculos diversificado e aberto a todos.

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Dos eventos realizados anualmente no concelho, o autarca, que detém o pelouro da Cultura, destaca, “sem hesitar, o Carnaval de Sesimbra, o Réveillon e a Temporada de Música da Casa de Ópera do Cabo Espichel”. Sobre os apoios do Governo, afirma que “aquilo que é disponibilizado pelo Orçamento de Estado para a cultura é insufi ciente”, assim como o é o “apoio dado às autarquias”. Depois de garantir que a maioria dos espectáculos que a autarquia promove “têm casa cheia”, reforçou que o número de espaços culturais “actualmente já é insufi ciente”, tanto para o projecto que o município quer desenvolver “como para o público que o procura”. Por este motivo está prevista a criação, “para os próximos tempos, de um conjunto de equipamentos culturais que pretendem aumentar a oferta”.

Dos investimentos a realizar destacou “o auditório na Quinta do Conde, de cerca de dois milhões de euros”, estando ainda previsto para a mesma freguesia “um novo pólo da Biblioteca Municipal e dois espaços destinados aos mais jovens”.

De que forma caracteriza a cultura no concelho?

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Sesimbra é um concelho privilegiado em termos de património, com o único castelo à beira-mar que mantém a traça medieval, uma fortaleza na praia, o imponente Cabo Espichel, as pegadas de dinossáurios e muitos outros exemplos. Assim, falar de cultura em Sesimbra é, desde logo, falar deste valioso património, da sua preservação e, sobretudo, da sua disponibilização ao público. É um trabalho que temos desenvolvido ao longo dos anos com resultados visíveis. A recuperação da Fortaleza, depois de uma árdua negociação
com o Estado para conseguirmos a sua posse, a abertura do Museu Marítimo, a recuperação da Casa da Água e do Aqueduto do Espichel, o restauro da Moagem de Sampaio ou a instalação do Centro de Cultura Marítima no antigo edifício da Rua Aníbal Esmeriz, em curso, são alguns casos. Todos estes processos têm envolvimento e colaboração da comunidade, de universidades e de entidades locais e nacionais. Noutro
âmbito, o município faz uma aposta muito forte na programação, tanto no Cineteatro como nos vários eventos que decorrem ao longo do ano por todo o território. Sesimbra é, sem dúvida, um dos municípios da região que mais investe em programação cultural.
Ao nível dos equipamentos, além daqueles que existem e que começam a ser insuficientes, temos em projecto um conjunto de novos espaços destinados à cultura, sobretudo na Quinta do Conde, que vão aumentar a oferta e as condições de trabalho.

 

Que linhas orientadoras na política cultural procura o município seguir?

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Em primeiro lugar, a preservação do valioso património do concelho e a sua disponibilização ao público, com uma programação bem estruturada. Depois, a existência de uma rede de equipamentos culturais públicos de qualidade. Em terceiro lugar, a recuperação e preservação das tradições e identidade do município, num trabalho em estreita parceria com a comunidade, e, por fim, a oferta de um programa de espectáculos diversificado e acessível a todos, durante todo o ano.

 

O município redefiniu a estratégia de programação para o Cineteatro João Mota, com investimento em espectáculos com outra dimensão. Que balanço faz desta aposta?

A aposta em grandes nomes da música nacional, e mesmo internacional (dou como exemplo Lloyd Cole), iniciou-se com a abertura do Cineteatro, em Abril de 2007. Aliás, um dos nomes que actuou na sala no primeiro mês foi Rui Veloso. Nos anos seguintes, recebemos Paulo de Carvalho, José Mário Branco, Sérgio Godinho, por mais que uma vez, os Clã, Jorge Palma, Amélia Muge, António Zambujo e tantos outros. Diria que em 16 anos
passaram por esta sala praticamente todos os grandes nomes da música portuguesa, o que garantidamente não é muito comum num concelho da dimensão de Sesimbra. Em 2018, o que fizemos foi reorganizar esta programação em formato de temporada, disponibilizando
a agenda de espectáculos e respectivos ingressos logo a partir de Outubro. É um modelo mais vantajoso, tanto para quem programa porque consegue atrair nomes mais interessantes, como para o público, que pode definir a sua  agenda antecipadamente. O período mais longo de venda de ingressos permite-nos ter praticamente todas as salas cheias. Ao agruparmos todos os espectáculos numa temporada, e numa revista gratuita, o público, e não só, acaba por se aperceber mais facilmente da dimensão desta oferta.

 

Quais os critérios da programação cultural do município?

Procuramos oferecer grandes espectáculos, com nomes cimeiros das artes de palco, dar a conhecer novos projectos e géneros que não são tão familiares do público, como é o caso da música erudita ou do jazz, apoiar os artistas locais e dar espaço ao movimento associativo.

 

Da programação anual, quais os eventos que destaca e porquê?

Sem hesitar, o Carnaval de Sesimbra, o Réveillon e a Temporada de Música da Casa de Ópera do Cabo Espichel. O primeiro é uma escolha óbvia, até porque é uma das grandes imagens de marca de Sesimbra. Por uma conjugação de factores, num determinado momento da sua história, a comunidade sesimbrense começou a viver o Carnaval de
forma intensa e apaixonada. Com o passar dos anos, essa paixão foi-se cimentando e atravessando gerações. Para se ter uma ideia, temos seis escolas de samba e três
grupos de Axé que movimentam centenas de participantes e que todos os anos dão forma a um dos mais belos desfiles do País. É um momento alto para o município, tanto pelos milhares de visitantes que recebe durante praticamente duas semanas, o que gera um enorme volume de negócios para a economia local, como pela visibilidade que dá
a Sesimbra. O segundo momento, o Réveillon, porque foi uma aposta da autarquia para criar mais um momento alto durante o ano que resultou em pleno. Em 2006, não havia festejos da passagem de ano em Sesimbra e eram poucos os que nos escolhiam como destino para entrar no novo ano. A partir de 2007, com ajuda da mediatização gerada
pelo original Réveillon Subaquático, Sesimbra passou a constar na lista dos mais procurados réveillons do País. Hoje, a última semana do ano é uma autêntica época alta, tal como o Verão ou o período de Carnaval, com as vantagens que isso nos traz, em termos económicos. A terceira escolha é um evento que conjuga música erudita com a nossa
história e o nosso valioso património edificado. A própria designação é inspirada numa antiga casa de ópera que existiu no Cabo Espichel e cujos vestígios ainda são bem visíveis Por ali passaram grandes companhias italianas, que eram aplaudidas pelo próprio rei. Esta temporadarecuperou e deu a conhecer essa parte da nossa história. A grande maioria dos espectáculos acontecem em igrejas e monumentos, o que além de proporcionar cenários
maravilhosos, dá também a conhecer estes espaços únicos ao público. É um dos poucos eventos desta natureza na região, o que, nas suas 16 edições realizadas, o tornou já numa
referência.

 

No quadro específico da gastronomia, a câmara apostou na imagem de que Sesimbra é Peixe. Quais os resultados dessa estratégia?

Iniciámos em 2013 a campanha Sesimbra é Peixe. O objectivo foi promover o pescado capturado pela nossa frota e, ao mesmo tempo, a restauração e a gastronomia local. Paralelamente, trabalhámos o tema como produto turístico. A campanha teve imenso sucesso e colocou a gastronomia e o peixe de Sesimbra como uma das principais
ofertas turísticas do município. Como consequência tivemos o aumento do consumo em restaurantes locais, a valorização do pescado e o aumento da procura pelo destino Sesimbra fora do período de Verão. Em 2018, com a criação da marca Sesimbra e a variante Yes Sesimbra, para a promoção do turismo, fizemos um interregno na campanha Sesimbra é Peixe. No entanto, desde 2013 que a gastronomia de Sesimbra ficou definitivamente associada a um produto turístico e cultural de excelência.

 

De que forma trabalha a câmara com as associações e colectividades culturais?

Em Sesimbra não existem muitas associações a trabalhar exclusivamente a vertente cultural. O associativismo desportivo ou juvenil é bastante mais representativo. O
trabalho que estamos a desenvolver, tanto com os jovens como com o público adulto (veja-se o caso do projeto Olharápios, do Cineteatro), pretende ser um incentivo e dar condições para o surgimento de novas associações culturais. Todas as associações, independentemente da área de actividade, recebem apoios anuais com base nos contratosprograma que apresentam. Algumas delas têm também apoio ao nível das instalações e aspectos logísticos, como transportes, por exemplo. Depois, há eventos pontuais que organizam e que, por norma, contam com apoio da autarquia, quer seja no reforço financeiro para fazer face a despesas, quer na componente logística.

 

O orçamento anual para a cultura é de cerca de 3 milhões e 300 mil euros. Em que áreas incide principalmente?

O orçamento destina-se não apenas à programação cultural, mas também à construção de novos equipamentos (neste caso o Auditório da Quinta do Conde e o Centro de Cultura Marítima).

 

Qual o impacto económico que a cultura tem no concelho?

Não temos forma de fazer um levantamento rigoroso do retorno, mas sabemos que muitos dos eventos culturais que apoiamos e desenvolvemos atraem milhares de pessoas ao concelho, o que tem um retorno claro para o tecido económico local.

 

Considera que os apoios do Governo atribuídos à cultura são suficientes? Estes têm reflexo no concelho?

Obviamente que não. Se aquilo que é disponibilizado pelo Orçamento de Estado para a cultura é manifestamente insuficiente, o apoio dado às autarquias é ainda mais insuficiente, sobretudo quando se trata de apoios que permitem preservar e recuperar património que é de todos. Muitas vezes, a simples passagem de um monumento
degradado para a posse de uma Câmara Municipal sem custos, para que esta possa recuperar, já seria uma grande ajuda, mas nem isso se verifica. Temos património do Estado a degradar-se por todo o país, porque continua a ser centralizado, quando
se sabe que a maioria das autarquias têm capacidade de desenvolver bem este trabalho.

 

Qual o papel das juntas de freguesia na cultura do concelho?

As juntas de freguesia têm autonomia para desenvolver os seus projectos culturais, no entanto, há muitos casos em que trabalham em parceria com as câmaras municipais.

 

Considera que a cultura é actualmente acessível a todos os cidadãos do concelho

É para isso que investimos numa programação de qualidade no Cineteatro, num conjunto de eventos regulares maioritariamente gratuitos e em equipamentos públicos de fruição gratuita ou com valor simbólico, como é o caso da Biblioteca Municipal, Museu Marítimo ou Capela do Espírito Santo. Aliás, é essa a função das autarquias locais, no que toca à
cultura. Sabemos que para assistir a um concerto de um grande nome numa sala em Lisboa, por exemplo, é necessário desembolsar 30 ou 40 euros por um bilhete. Se falarmos de um casal ou de uma família com dois filhos e rendimentos médios, provavelmente não terão disponibilidade para adquirir quatro bilhetes. Contas por alto, para o mesmo concerto no Cineteatro Municipal, o valor de um bilhete na capital permite que toda a família assista ao espectáculo. Depois lembro, por exemplo, que os espetáculos da Temporada de Música da Casa de Ópera, do Ciclo Cezimbra Antiqua, da Música no Verão e tantos outros, são de entrada gratuita. Note-se que o acesso à cultura não se resume apenas aos espectáculos de palco. A criação de espaços museológicos que preservem e expliquem a história e a construção de uma programação em torno desses espaços que incentive e facilite o envolvimento da comunidade ou a existência de uma biblioteca pública são factores
decisivos para abrirmos portas à cultura.

 

O parque de equipamentos culturais do concelho é o adequado às necessidades e à política que se pretende seguir ou identifica necessidades de alguns equipamentos?

Consideramos que o que existe actualmente já é insuficiente, tanto para o projecto que queremos desenvolver como para o público que o procura. Daí que tenhamos previstos, para os próximos tempos, um conjunto de equipamentos culturais que pretendem aumentar a oferta. Destaco o auditório na Quinta do Conde, uma necessidade há muito
identificada pela Câmara Municipal e reivindicada pela população, cujo concurso público vai ser finalmentelançado. Trata-se de um investimento de cerca de dois milhões de euros
que nos vai permitir desenvolver uma programação regular nesta jovem freguesia e, além disso, e talvez mais importante, vai criar condições para o surgimento de novos projectos
artísticos.

Na mesma freguesia temos em projecto um novo pólo da Biblioteca Municipal e dois espaços destinados aos mais jovens, o Spot das Artes, no Parque da Vila, e a reformulação do Auditório da Boa Água, num conceito de espaço para manifestações artísticas, coworking e muito mais. No Parque Augusto Pólvora será instalado um novo
auditório, também destinado à juventude, porque consideramos que, por um lado, o desenvolvimento de um projecto cultural deve estar ligado de forma estreita às gerações
mais jovens, e por outro porque a cultura é um pilar essencial na formação cívica destes jovens. Acrescento ainda a criação do Centro de Cultura Marítima, em Sesimbra, uma candidatura ao programa EEA Grants que nos permitiu recuperar um edifício histórico no centro da  vila, que vai ter um papel essencial na preservação do nosso valiosíssimo património histórico ligado ao mar e à pesca.

 

Os públicos correspondem ao que a estratégia de programação tem procurado oferecer?

A regularidade com que promovemos espectáculos, cinema e outras manifestações artísticas vão criando hábitos no público e, hoje, a maioria dos espectáculos que promovemos têm casa cheia. Muitos dos espectadores assíduos começaram por assistir aos
espectáculos de artistas de renome, até que um dia resolveram “arriscar”
e assistir a um novo projecto ou à apresentação de um artista local. Na maioria dos casos, são surpreendidos e voltam. Costuma falar-se na formação de públicos, mas prefiro pensar que é uma relação de confiança e cumplicidade que se cria. Temos dois projectos em curso
que são muito interessantes neste trabalho com os públicos. Um deles os Olharápios, em que convidamos um conjunto de espectadores, de várias idades e com vários interesses,
a programar a agenda do Cineteatro durante um mês. Os resultados são surpreendentes. Outro o Gente de Cá, em que convidamos artistas locais ou artistas que, de algum
modo, tenham uma ligação ao concelho para vir actuar. O “carimbo” Gente de Cá, neste momento, é um sinónimo de espectáculo de qualidade.

 

Quais os principais desafios da política cultural municipal actuais e futuros?

Em primeiro lugar, é fundamental reforçar a oferta de espaços para fruição cultural na freguesia da Quinta do Conde, com a construção do auditório, do pólo da biblioteca e dos dois espaços para as artes e para a juventude. Além da obra propriamente dita haverá, paralelamente, todo um trabalho de programação destes espaços e de apelo à participação
da comunidade, do movimento associativo e das entidades locais. Queremos que trabalhem connosco e que, de certa forma, se apropriem destes espaços e equipamentos e os tornem seus. O nosso papel é dinamizar toda esta gente em torno de um projecto comum.
Em segundo lugar, é importante continuarmos a preservação, promoção e disponibilização do património do município. A câmara já deu provas, em várias ocasiões, de que tem capacidade para o fazer, e bem. Vejamos a Fortaleza de Santiago, a Casa de Água do
Cabo Espichel ou a Moagem de Sampaio ou, mais recentemente, a Capela de São Sebastião ou o Edifício da Rua Aníbal Esmeriz, onde vai surgir o Centro Cultural Costeiro. Queremos prosseguir este trabalho e queremos condições para o fazer. Em terceiro lugar, dar continuidade à programação cultural regular, se possível reforçando-a e diversificando-a para outras vertentes não tão exploradas.

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