28 Junho 2024, Sexta-feira

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Pedro Lopes: “O novo edifício deve ser aproveitado para requalificar todo o hospital”

Pedro Lopes: “O novo edifício deve ser aproveitado para requalificar todo o hospital”

Pedro Lopes: “O novo edifício deve ser aproveitado para requalificar todo o hospital”

Administrador defende que a construção das novas urgências é uma oportunidade para reestruturar os serviços e “repensar o funcionamento do Hospital de São Bernardo como um todo”

 

Em entrevista por escrito, condição que O SETUBALENSE aceitou face à importância de ouvir o presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar de Setúbal, Pedro Lopes faz o balanço dos primeiros meses de mandato desta nova administração e fala sobre as questões da actualidade como as condições do Hospital de São Bernardo, a importância da ampliação das instalações e o funcionamento alternado das urgências de Pediatria e de Ginecologia e Obstetrícia. Sobre este novo modelo, de rotatividade pelos hospitais da região, que implica o encerramento quinzenal aos fins-de-semana, diz que, apesar de impopular, contribuiu para dar uma “resposta possível, efectiva e sem significativas disrupções” e que tranquilizou os utentes.

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Que balanço faz dos primeiros oito meses na presidência do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS)?

O exercício deste cargo tem sido muito entusiasmante porque permitiu ao conselho de administração conhecer um número muito significativo de profissionais de elevada competência técnica e incomensurável sentido de missão e dedicação à causa pública, com os quais temos partilhado a gestão do centro hospitalar, observando as limitações, conhecendo os problemas e procurando de forma honesta, leal e transparente encontrar soluções que promovam e dignifiquem os trabalhadores e a instituição. Este período tem também sido caracterizado por uma elevada intensidade de trabalho visto que o CHS é uma unidade de elevada complexidade técnica, à qual está cometida uma responsabilidade assistencial que em muito ultrapassa a área geográfica correspondente aos concelhos de Setúbal, Palmela e Sesimbra. A gestão de uma unidade hospitalar desta dimensão exige profunda dedicação e empenho, atributos que o conselho de administração assume como missão e nessa medida são indutores de satisfação e motivação pessoal.

Além da ampliação, cujas obras já arrancaram, quais são os principais desafios para o centro hospitalar?

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Se atendermos ao que se passa em Portugal, na Europa e nos países que integram a OCDE, verificamos que os sistemas de saúde encontram na actualidade um desafio gigantesco que se prende com a captação e retenção de recursos humanos. Efectivamente, as profissões da saúde determinam um grau de exigência, um nível de responsabilização e uma capacidade de resistência muito acima do que acontece noutros sectores da sociedade. Aos profissionais de saúde é-lhes exigido conhecimentos científicos robustos e permanentemente actualizados, actuam diariamente em contexto de grande fragilidade psicológica e física dos utentes que os procuram e nem sempre se observam acompanhados de todas as condições infra-estruturais que gostariam. A intensidade do seu trabalho e a carga emocional que o mesmo encerra frequentemente perpassa o ambiente estritamente da prática profissional e invade a sua vida pessoal. Neste contexto não é hoje simples nem fácil ser-se profissional de saúde pelo que acredito que o alento dos profissionais de saúde se encontra fortemente ancorado na vontade de cuidar do próximo. Outro grande desafio que se coloca a este centro hospitalar, às demais unidades hospitalares, às unidades de cuidados de saúde primários, em suma, ao Serviço Nacional de Saúde, prende-se com o facto de as necessidades de saúde da população exigirem abordagens assistenciais distintas das que na actualidade asseguramos. As organizações de saúde têm de se ajustar no sentido de alinharem a sua actuação aos novos desafios decorrentes, nomeadamente do envelhecimento da população, da resposta à elevada prevalência da multi-morbilidade dos utentes, própria do seu nível de envelhecimento, do ressurgimento das doenças transmissíveis, do nível pandémico que algumas doenças não transmissíveis estão a assumir, como sejam a obesidade, a diabetes, as doenças mentais, entre outras. Em suma, a visão episódica, “hospitalocêntrica” e, dentro desta, ainda “urgenticocêntrica”, pouco articulada entre os vários níveis de cuidados que têm prevalecido nos últimos anos tem de ser alterada para uma visão mais integradora, mais participada pelo utente e mais agregadora de todos os agentes e entidades da sociedade civil que directa ou indirectamente contribuem para mitigar os determinantes sociais da saúde. Esta alteração de paradigma envolve não só a reformulação das entidades prestadoras dos cuidados de saúde, como também exige uma actuação mais proactiva da sociedade e um nível de responsabilização superior dos utentes.

Como decorreram os preparativos para o arranque da obra de ampliação do Hospital de São Bernardo?

Os trabalhos foram iniciados no passado dia 23 de Março. Para tal mostrou-se necessário desenvolver um conjunto de diligências prévias, nomeadamente a remoção da área contentorizada em frente ao serviço de Urgência que funcionou como “área ADR” (área para assistência a utentes infectados com o coronavírus SARS-CoV-2), a promoção de reuniões com a Câmara Municipal de Setúbal para explicitação da intervenção e envolvimento da edilidade no ajuste das acessibilidades ao hospital, tendo em conta as limitações de circulação que esta obra determinará e, ainda, a necessidade de acautelar a normal circulação de utentes e profissionais em simultâneo com a circulação de máquinas e veículos pesados envolvidos na empreitada. Da parte do conselho de administração estamos preocupados com os constrangimentos funcionais que os avanços das obras determinarão porquanto não será fácil acomodar o normal funcionamento dos serviços, em particular o serviço de Urgência, com os trabalhos de construção civil realizados em simultâneo e em grande proximidade. Por outro lado, as limitações de acesso e circulação no perímetro hospitalar constituem motivo de atenção próxima, bem como as limitações de lugares de parqueamento para utentes e profissionais. Importa salientar o nível de compreensão e colaboração que temos observado por parte dos utentes, profissionais, fornecedores externos e demais visitantes. Merece ainda realce a boa colaboração que a Liga dos Amigos do Hospital de São Bernardo tem assegurado no sentido do bar que se encontrava sediado em frente ao serviço de Urgência possa rapidamente ser deslocalizado para área contígua, e assim, manter a disponibilização de serviços de restauração aos utentes do serviço de Urgência e Consulta Externa. Enaltece-se ainda o apoio e envolvimento da Câmara Municipal de Setúbal, que se tem mostrado disponível para connosco encontrar soluções no que respeita aos acessos e circulação externa ao perímetro hospitalar.

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Nos últimos anos o Serviço Nacional de Saúde tem enfrentado grandes desafios. Como vê a situação do SNS?

Como referido anteriormente, atentas as actuais necessidades de saúde da população, mostra-se necessário promover a reconfiguração do SNS essencialmente por forma a poder disponibilizar à população uma aposta robusta na promoção da saúde e prevenção da doença, um nível de articulação vertical e horizontal de cuidados que vá ao encontro de respostas assistenciais estruturadas, que assegure o continuum do processo assistencial e se mostre sustentado numa visão holística dos utentes. Importa referir também o papel essencial que os utentes devem assumir e que respeita ao seu envolvimento activo e responsabilizante no processo assistencial e ainda na correcta utilização dos serviços de saúde.

Quantos médicos estão em falta para o CHS funcionar em pleno?

Nos últimos dois anos, em termos globais, o Centro Hospitalar de Setúbal veio incrementando o seu mapa de pessoal. Apesar desta evolução positiva sentimos necessidade de continuar a desenvolver todos os esforços para garantir que as equipas vão sendo robustecidas. No que respeita particularmente aos profissionais médicos é evidente a necessidade de efectivos estando também cientes de que, lamentavelmente, esta situação não se encontra delimitada a esta unidade hospitalar.

Foi anunciado que os hospitais vão passar a poder contratar os médicos directamente. É uma medida boa para o CHS?

Esta medida é muito recente e não existem à data dados objectivos que nos permitam uma análise tecnicamente sustentada. Em todo o caso, devolver capacidade de gestão aos conselhos de administração parece-me uma medida de empoderamento que é muito importante pois incrementa agilidade e flexibiliza ao processo de tomada de decisão.

Qual o número de médicos que costuma trabalhar em cada uma das urgências em cada turno? É suficiente para as necessidades?

As equipas médicas são ajustadas à tipologia do serviço de Urgência, sendo que habitualmente a equipa do serviço de Urgência Geral na especialidade de Medicina Interna é composta por sete médicos e um médico que assume a função de chefe de equipa, na especialidade de Cirurgia Geral e Ortopedia a composição habitual considera três médicos; o serviço de Urgência Pediátrico é habitualmente constituído por equipas de quatro médicos e a equipa do serviço de Urgência de Ginecologia/Obstetrícia é habitualmente constituída por três médicos. De referir que a generalidade dos hospitais não dispõe de um corpo clínico nos serviços de urgência constituído exclusivamente por profissionais integrados no respectivo mapa de pessoal, mostrando-se necessário recorrer à contratação de profissionais em regime de prestação de serviços.

De que forma trabalha o conselho de administração no sentido de reter os profissionais?

O conselho de administração tem procurado estar perto dos profissionais para melhor perceber as suas necessidades e adequar as decisões à realidade. Uma das intervenções que para nós é mais importante constitui a aposta na formação e desenvolvimento técnico e científico dos profissionais. Vamos terminar este mês o processo de contratualização interno com todos os serviços assistenciais. Do modelo de plano de acção instituído consta a preocupação com a área da formação dos profissionais, passando a mesma a ser também alvo de valorização em termos de desempenho dos serviços. Iremos continuar a investir de forma sustentada no melhoramento das instalações e no reapetrechamento técnico e tecnológico por forma a melhorar as condições de trabalho dos profissionais e a disponibilizar-lhes o acesso a tecnologia de última geração no propósito de garantir que a actividade que exercem incorpora o melhor conhecimento científico. Outra área que nos preocupa prende-se com a taxa de absentismo que observamos. No propósito de debelarmos este problema estamos a apostar na capacitação do Serviço de Segurança e Saúde no Trabalho.

Qual o serviço onde se sente mais esta falta de médicos e outros profissionais?

Como referido, verificam-se carências em vários serviços do hospital a que estamos atentos e dispostos a contratar profissionais médicos. A grande limitação é a indisponibilidade de efectivos que pretendam integrar o SNS e, por outro lado, a frequente incapacidade de os reter, contexto que está neste momento em análise pelo Ministério da Saúde no propósito de poderem ser encontradas soluções que sejam reconhecidas pelos profissionais como aliciantes e motivadoras e, nesse sentido, atractivas para entrar ou retomar o SNS.

A nova Unidade de Internamento de Curta Duração entrou em funcionamento no dia 23 de Fevereiro. Qual foi o investimento e como tem funcionado?

O investimento nesta unidade totalizou cerca de 1,2 milhões de euros. Esta unidade tem permitido reduzir o número de utentes que permaneciam nos corredores do serviço de Urgência e, portanto, traduz uma melhoria de qualidade assistencial para os utentes e profissionais. Com a conclusão do novo edifício do Centro Hospitalar de Setúbal haverá que realizar um exercício de reestruturação e requalificação do actual edificado hospitalar de modo a incrementar o seu nível de funcionalidade e eficácia. Assim, entendemos que da construção de um novo edifício não pode apenas resultar benefício para os serviços que aí serão instalados. Esta oportunidade deve ser aproveitada para repensar o funcionamento do Hospital de São Bernardo como um todo, impulsionador da optimização de processos, incremento da qualidade assistencial, melhoria das condições de trabalho para os profissionais e da segurança dos cuidados de saúde prestados aos utentes. Gostaria de aproveitar a oportunidade para expressar publicamente o meu agradecimento à família Bühler-Brockhaus que generosamente doou um importante montante financeiro que tornou possível a execução desta obra.

A direcção executiva do SNS decidiu que, a partir de 1 de Abril, as urgências de Pediatria e de Ginecologia e Obstetrícia, assim como o bloco de partos, do CHS, encerram, de 15 em 15 dias, aos fins-de-semana. Como avalia esta medida?

Esta medida não é certamente popular nem constitui, com toda a certeza, a vontade da generalidade dos profissionais, dos conselhos de administração dos hospitais do SNS e certamente da própria direcção executiva. Contudo, está sustentada numa visão muito objectiva e real do actual contexto de incapacidade parcial das unidades hospitalares responderem em pleno e em simultâneo em algumas especialidades presentes nos serviços de urgência. Assim, entendo que esta medida contribuiu para encontrar uma resposta possível e, acima de tudo, efectiva, sem significativas disrupções, que tranquilizou os utentes e os dotou da informação necessária para que possam, com segurança, procurar os cuidados de saúde de que necessitam, permitindo complementarmente ao SNS o tempo necessário à reflexão sobre as medidas estruturais que devem ser adoptadas para assegurar a sua missão.

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