10 Agosto 2024, Sábado

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Omissão de dívidas leva tribunal a decidir que Jéssica não precisava de proteção

Omissão de dívidas leva tribunal a decidir que Jéssica não precisava de proteção

Omissão de dívidas leva tribunal a decidir que Jéssica não precisava de proteção

Julgamento começou em Setúbal

Processo iniciado pela Comissão de Protecção de Menores foi arquivado depois de Segurança Social ter dito que já não havia perigo

O Tribunal de Família e Menores de Setúbal arquivou o processo judicial de protecção da menina que morreu espancada em Setúbal, porque não foi denunciado à equipa da Segurança Social que acompanhava o caso qualquer situação de perigo, designadamente a existência de dividas.
O único perigo que chegou ao conhecimento do tribunal, a partir da Segurança Social, foi a situação de violência doméstica entre a mãe, Inês e o ex-companheiro, pai de Jéssica, há dois anos e que originou a abertura do processo, em Maio de 2020.
Volvidos dois anos e com a relação terminada, Jéssica encontrava-se ao cuidado do novo namorado de Inês, numa casa onde era bem tratada. Assim, a equipa da Segurança Social que visitou a menina em Maio deste ano propôs ao tribunal o arquivamento, o que aconteceu precisamente 20 dias antes da menina morrer às mãos de uma família a quem a mãe desta devia dinheiro.
De acordo com as conclusões do processo, este foi instaurado a 18 de maio de 2020. Na origem estava a violência física entre a mãe, Inês e o pai, Alexandrino, em frente à menor na casa onde viviam.
Uma equipa multidisciplinar da Segurança Social de Setúbal actuou. A avó materna disse que os desentendimentos e a violência ocorriam sobretudo devido ao facto de nenhum dos dois trabalhar e consequentemente não haver dinheiro para fazer face às despesas da família.
Em Junho, um mês depois, foi feita uma avaliação da situação em que a menina vivia e após audição do casal e da avó materna foi aplicada a favor da Jéssica uma medida de promoção de apoio junto dos pais, com a supervisão da avó materna, pelo período de um ano.
“Foi estabelecido um conjunto de obrigações de cuidados relativos à criança que removessem o perigo que esteve na origem do pedido, qual seja a violência entre os progenitores, medida essa que obteve o consentimento destes e da avó materna”.
Um ano depois, em Junho de 2021, a equipa da Segurança Social voltou ao caso e decidiu manter a medida tendo em conta que o casal continuava a desentender-se, considerando tal como um perigo para a menina. Foi proposta a manutenção da medida, com a menina supervisionada pela avó. Isto “por se considerar existirem ainda fragilidades associadas ao agregado familiar, designadamente a existência de períodos de rutura e de reconciliação na relação dos pais, assumindo a avó materna a responsabilidade de supervisionar os cuidados parentais à neta, com quem estaria todos os dias”.
Em Março de 2021, a criança foi inscrita numa creche, mas a adaptação “não teria sido fácil em face da sua ligação afectiva aos pais e por ter estado muito tempo com estes”, é descrito no processo. De acordo com a avó materna, nesta segunda visita da Segurança Social, a situação de violência doméstica entre o pai e a mãe de Jéssica acalmou, embora terá sido nesse contexto que acabou por existir a separação, perto do fim de 2021.
Volvido um ano, em Maio passado, a equipa da Segurança Social revisitou Jéssica e o que encontrou foi bastante diferente. A visita domiciliária da equipa da Segurança Social à casa de Paulo Amâncio em Maio passado foi do agrado das técnicas, que propuseram então o arquivamento do processo pela ausência de perigos.
Nada foi dito por Paulo, Inês ou a avó da menina da existência de dívidas pela mãe a pessoas que acabariam por matar a menina. No processo também não consta como ocorreu a separação da mãe e do pai, tendo Inês dormido na rua com a menina antes de encontrar abrigo na casa de uma amiga e depois de Paulo Amâncio, o pescador com quem estava na altura da morte da filha. Este facto foi omitido à Segurança Social.
Nesta visita, a técnica da Segurança Social esteve presencialmente com a criança “a qual apresentava os seus cuidados de higiene e vestuário assegurados”. A casa onde Paulo e Inês viviam com Jéssica estava limpa. “O apartamento composto por dois quartos, duas salas, cozinha e duas casas de banho, apresentando-se a habitação organizada e limpa, com boas condições de conforto e de habitabilidade, beneficiando dos serviços básicos essenciais”, lê-se.
A Segurança Social verificou que as consultas e o plano de vacinação da criança estavam a ser asseguradas e, em Março de 2022, a mãe havia feito a inscrição da filha para um equipamento de infância em Setúbal, aguardando a indicação de vaga. Neste quadro, tendo em conta a inexistência de quaisquer outros sinais de perigo, mantendo-se a supervisão da avó materna, com quem a menina estaria todos os dias, a equipa propôs o encerramento do processo por já não subsistir a situação de perigo.
O tribunal acabou por arquivar o processo a 30 de Maio “em virtude de a situação de perigo não se comprovar ou já não subsistir”. Nos 20 dias até à morte da menina “não chegou ao conhecimento do Juízo de Família e Menores de Setúbal qualquer sinalização de perigo efetuada relativamente a esta criança até ao momento em que foi divulgada a notícia sobre o seu falecimento”.
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