Com um modelo apelidado de Celebrações em Honra de Nossa Senhora da Boa Viagem, este ano as Festas da Moita mantêm-se vivas e acarinhadas pelos moitenses, apesar da Covid-19
Nuno Carvalho, presidente da Comissão Organizadora das Festas da Moita, revela os desafios de organizar uma tradição centenária com um modelo totalmente diferente, mas sem perder o seu simbolismo cultural.
Desde a música em movimento e convívio, aos touros simbólicos apresentados num carro alegórico, até ao culto religioso, todos os momentos das Celebrações em Honra de Nossa Senhora da Boa Viagem foram criados a pensar nas regras impostas pela Saúde Pública e na segurança da população. Por isso não há feira franca nem mostra empresarial.
Em termos de retorno financeiro o que representa esta mudança?
As Festas da Moita não podem ser vistas apenas pelo retorno financeiro para a autarquia. Temos de encará-las como um factor de criação de riqueza e de postos de trabalho. Este ano não podemos ter o negócio tradicional dos feirantes, nem tudo aquilo que queríamos, mas há toda uma actividade comercial que está enquadrada.
Desde a primeira fase que, enquanto Comissão Organizadora, percebemos que não poderíamos fazer uma festa tradicional, com a Tarde do Fogareiro ou as largadas de touros, mas sempre dissemos que não iríamos cancelar tudo e sim perceber qual a evolução da pandemia, entendendo que devíamos fazer alguma coisa. Algo que reunisse o bombo, o cabeçudo, a presença simbólica dos touros e, claro, a homenagem a Nossa Senhora da Boa Viagem.
Não podíamos apagar as nossas tradições, cortando as nossas vivências, pelo que decidimos fazer pequenos apontamentos que relembram a nossa festa. Contudo, sempre em movimento e sem iniciativas que congreguem o ajuntamento, mantendo o distanciamento social obrigatório.
A escolha dos artistas foi realizada com o objectivo de evitar os ajuntamentos?
Sim, até porque houve o cuidado de não agendar estes pequenos apontamentos musicais para o fim-de-semana. Aliás os dias significativos das festas nunca coincidem com o fim-de-semana, apenas no domingo [13], que é o dia procissão em Honra de Nossa Senhora da Boa Viagem. Na terça-feira [este ano a dia 15] assinala-se o Dia do Município e na quinta-feira [17], dado que a Moita é uma vila muito taurina, vamos assinalar com uma corrida de toiros.
Nos dois finais de semana [antes e depois da programação referida] não temos as festas e apelamos para que as pessoas cumpram as regras, até porque não existirá a tradicional animação de rua e o que temos previsto enquadra-se na situação actual. Nem mesmo a feira franca será realizada. Assim como também não haverá suplemento de horários para o estabelecimento de restauração. Tudo nos moldes em que todo o país está a funcionar.
Na gestão de resíduos, está previsto algum plano especial devido à Covid-19?
No ano passado e em termos de festas populares fomos aquela a que mais reciclou. A par dos festivais Sol da Caparica e Super Bock Super Rock. Este ano não se espera uma afluência tão grande de pessoas, que possa gerar um grande número de resíduos, portanto, não temos nenhum programa especial a esse nível.
Está previsto algum reforço de patrulhamento por parte das autoridades para evitar aglomerados, nomeadamente na noite do fogo-de-artifício?
Não quisemos que fosse no mesmo local, por ser um espaço aprazível junto ao rio. O fogo-de-artifício será realizado de forma completamente diferente, com morteiros. Peças que têm um alcance muito grande em termos de altitude. Uma sessão com menos da metade do tempo normal, que será lançada de um espaço mais isolado, que não vamos revelar.
Nessa noite vamos contar, provavelmente, com a presença de algumas forças de segurança, para garantir que não haja ajuntamentos. No dia-a-dia das comemorações, o momento que mais nos preocupa é a procissão, que inclui a tradição da bênção dos barcos no cais.
Por isso, esta tradição também terá de ser cumprida em moldes diferentes. Nossa Senhora da Boa Viagem vai ser transportada num veículo dos bombeiros e estará sempre em andamento, sem baixar ao tabuleiro do cais. O acesso ao ancoradouro do cais vai estar vedado, apenas acessível ao proprietário do barco e a um acompanhante, estando estas pessoas identificadas.
Ainda assim, estamos a equacionar criar zonas de contenção para as pessoas, de modo a que não se juntem em determinadas zonas. Para isso, naturalmente que também contaremos com as forças de segurança, para fazer cumprir as normas e a legislação em vigor. Apelamos ainda às pessoas que fiquem em casa, porque a procissão vai percorrer todas as ruas da vila.
Nas celebrações religiosas qual será o maior desafio?
Não vai ser montado o pavilhão onde era feita a queima das velas. E a missa de domingo, segundo o pároco informou, não será realizada dentro da igreja, mas no quintal da mesma, ao ar livre, o que possibilita que haja mais gente e reunir as condições necessárias ao distanciamento.
A regata de embarcações tradicionais também inclui alterações ao seu modelo habitual?
Este ano, no lugar da regata de embarcações tradicionais do Tejo teremos o evento “Velas ao Vento”. Um momento em que vamos “salpicar” o rio com os nossos barcos, também aqui apenas com a presença do dono e de um acompanhante, não havendo o espírito competitivo, pois servirá somente para ver as embarcações no rio.
É a primeira vez que as Festas da Moita se realizam fora do seu desenho tradicional?
Há 70 anos, quando houve o incêndio na antiga Praça de Toiros da Caldeira e até inauguramos a nova praça a festa, foi mais sustentada com base na vertente religiosa. Uma época em que os dias de festas também eram menos. Começava ao sábado acabava à segunda-feira ou terça-feira.
Público com reacção positiva a celebrações moderadas
Este ano, o programa comemorativo das Celebrações em Honra de Nossa Senhora da Boa Viagem já foi visto por mais de 29 mil pessoas na internet. Quanto ao vídeo de apresentação dos festejos já alcançou mais de 19 mil visualizações.
E após esta divulgação, Nuno Carvalho afirma que “já não há agitação, há muita gente a reconhecer o trabalho que está a ser feito”.