História do felpudo é exemplo a seguir. Foi adoptado e já é a mascote da comunidade escolar. É o chefe de uma tribo de sete e dá a cara por uma campanha de recolha de alimentos
Não é maltês, não toca piano nem tão-pouco fala francês. É português, tem pinta de artista – a partir de hoje rebola-se a outro nível, mais elevado, de estrelato – e mia, como um sabidão assobia, para as meninas de quando em vez.
O bicho, todo ele é estilo, tem olhos verdes sedutores, um corpinho já menos Danone, um pouco roliço, repolhudo até, para que possa candidatar-se a um concurso de beleza de magricelas (mas ele quer lá saber disso…o que importa é afiar o serrote quando a bandulho começa a dar horas), e, quando a ocasião o impõe, apresenta-se com uma pose de verdadeiro chefe de Estado, de orelhão em pé e todo esticado.
Pudera, saiu-lhe a sorte grande sem jogar. Vive como um lorde. Comidinha a tempo e horas, sem ter de cozinhar, e um palácio do melhor equipado, com espaço de sobra para afiar as unhacas, corredores e salas sem fim, para calcorrear, ginásio (recém-inaugurado) onde, certamente, ainda não foi cheirar – porque a vida do comer-deitar é só para quem sabe aproveitar –, e até uma vista de rei sobre a cidade, sempre que trepa ao último piso para se espreguiçar ou desenfadar.
O felpudo sofisticado não deixa, porém, de imitar a tendência da moda de Mark Zuckerberg, CEO do Facebook – rede social a que aderiu recentemente –, já que usa todos os dias da semana a mesma farpela de tons cinza e listados. Não custa, pois, adivinhar que foi a partir daí que adveio a ideia do nome atribuído a esta “eminência parda” da Escola Secundária Jorge Peixinho.
O Riscas é o mais recente membro desta comunidade escolar. Foi adoptado e rapidamente deu a volta à cabecinha de todos, delas e deles, de alunos e de funcionários, de professores e directores. É um miau, como se costuma dizer aos pequenotes que mal largaram as fraldas. Mas um miau de charme refinado e fino como o papel de seda.
O espertalhão do gato, para caloiro, faz mais do que jus ao “apelido”, já risca no burgo como gente grande. Basta-lhe uma sacudidela de cauda ou um franzir de bigodes e é vê-las e vê-los a derreterem-se às patas do “menino”. Sabe-a toda, é o que é! Sabe tanto que até faz as poses mais ternurentas que se possam imaginar, para aparecer nas redes sociais e alargar a legião de fãs.
“DDT” para meninas da secretaria e professoras
“Ele é o DDT – Dono Disto Tudo”, dizem as meninas da secretaria da escola, Maria de Lurdes Ribeiro, Raquel Catarino e Helena Marques, sem mostrarem grande espanto pela notoriedade do bichano ter encontrado eco no DIÁRIO DA REGIÃO. Há muito que lhe tiraram a pinta, até porque foram as primeiras a suportar o custo da alimentação do miau que as levou no bico com manha e ternura. “Começou a aparecer por aqui todos os dias e foi-se instalando. E foi sempre dando a mão, muito meigo. Vinha todos os dias”, contam, depois de terem caído na “cantiga do bandido”.
Surgiu na escola em Julho do ano passado. Seduziu, seduziu, seduziu… até ser acolhido, vacinado e esterilizado. Passou rapidamente a figura principal e, hoje em dia, é o chefe de uma tribo de sete miaus que foram adoptados pela escola e para os quais os alunos do 8.º E angariaram verbas para a compra de “duas casotas impermeabilizadas e mantinhas”, onde a bicheza pernoita. A excepção só podia ser o Riscas. “É tão esperto que, à noite, as senhoras querem fechar a escola e ele esconde-se para ficar cá dentro.”
Mas, afinal, onde é que anda o Riscas? Tinha saído há pouco da secretaria. A professora Sónia Santos, que serviu de cicerone à visita do DIÁRIO DA REGIÃO, de gabinete em gabinete, nem precisou de pensar muito. “Ele anda sempre atrás da professora Laurinda”, disse e… acertou. O felpudo repolhudo lá estava de gabinete, juntamente com outras docentes. Mas estava ocupado. Assistia a uma reunião de trabalho. “Ele está aqui, mas é só um minuto… estamos a terminar”, confirmou a professora Laurinda.
Fez-se então um compasso de espera. A ocasião, entretanto, até mereceu honras de recepção da directora do estabelecimento de ensino, Maria João Serra, outra das madrinhas do Riscas. Finalmente, lá veio ao colo da professora Laurinda, para a realização de um vídeo promocional e de umas fotos de grupo, para a posteridade.
“Foi entrando na escola e… apoderou-se da escola. É a nossa mascote”, admitiu Maria João Serra, salientando as preferências da “eminência parda”: “Adora ir às aulas de desenho e também às de educação especial. É muito sociável. Agora vai ter é de fazer dieta.”
Já figura no Instagram e tem página no Facebook. Em curso está a criação de um clube com o objectivo de angariar alimentação para o Riscas & Companhia, junto de alunos, encarregados de educação e comunidade em geral. “Para mantermos uma despensa, nos meses em que não temos cá alunos, para os alimentarmos”, explicaram Sónia Santos, Filipa e Laurinda, algumas das madrinhas do peludo barrigudo, acompanhadas pelas professoras Conceição Pequito, Maria José Caetano, Armanda Marquez e Fátima Moreira.
O Riscas significa mais do que uma mascote. A história de vida do “DDT”, num distrito que foi identificado como o primeiro do País em que se registaram mais maus-tratos a animais em 2016, é um sinal de educação, de esperança. “É uma tentativa de humanizar a escola e sensibilizar para a questão do abandono de animais”, concluiu Maria João Serra.