“Nesta casa ninguém baixa os braços”. Pedidos de ajuda ao Banco Alimentar de Setúbal duplicaram

“Nesta casa ninguém baixa os braços”. Pedidos de ajuda ao Banco Alimentar de Setúbal duplicaram

“Nesta casa ninguém baixa os braços”. Pedidos de ajuda ao Banco Alimentar de Setúbal duplicaram

||||||||Enfermeiro militar

Banco Alimentar de Setúbal fornece 172 instituições sociais do distrito e, durante o último mês, no pico da procura, entregou 120 toneladas de alimentos num só dia. A Covid-19 trouxe desemprego, fome e mais pedidos de ajuda. No CASA, em Setúbal e na Criar-T, no Seixal os pedidos de ajuda de famílias e da comunidade sem-abrigo, não param de chegar.

 

 

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No último mês, os pedidos de ajuda de Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) ao Banco Alimentar Contra a Fome de Setúbal “dispararam mais de 50%”, afirma Pedro Cunha, presidente desta delegação. “E o maior volume de alimentos entregue a instituições num só dia foi de 120 toneladas”, destaca.

Um acréscimo que, “só nesse dia em particular” representou mais 25% do volume de alimentos que o Banco Alimentar de Setúbal pode entregar num dia.

Os voluntários e a direcção deste Banco estão agora a responder em contra-relógio a centenas de pedidos de apoio. Desde o início da pandemia as doações alimentares chegam a um total de 172 instituições do distrito, através das quais 33 mil pessoas recebem ajuda, sendo o concelho do Seixal o que recebe maior apoio, seguido de Almada e Setúbal.

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Voluntários estão a trabalhar em contra-relógio para entregar alimentos a 172 Instituições Particulares de Solidariedade Social. Fotografia: MÁRIO ROMÃO

Todas as quartas-feiras e quintas-feiras, representantes de 80 a 100 instituições, param frente ao armazém do Banco Alimentar de Setúbal. As pares, seguindo as regras de contingência para a Covid-19, os representantes das IPSS ajudam os voluntários a carregar os alimentos com os quais, depois, vão preparar refeições ou fazer cabazes que apoiam milhares de famílias.

“Nas IPSS os pedidos de ajuda alimentar duplicaram devido à Covid-19 e os alimentos não param de sair do Banco”. Mas as doações também não param de chegar. Para Pedro Cunha essa é a maior confirmação do quanto a solidariedade se mantém activa na região e destaca apoios recentes vindos da SECIL e da Coca-Cola. “No entanto, é preciso sempre mais e o trabalho diário de contactos e angariação não pode parar, nesta casa onde ninguém baixa os braços”.

Nas próximas semanas os desafios do Banco Alimentar, em Setúbal e em todo o país, “serão ainda maiores”, refere Pedro Cunha. É preciso garantir que a campanha de Maio não passa em branco, mesmo sem a recolha de doações em supermercado. Porque, só na delegação de Setúbal, as campanhas de supermercado representam 17% do total dos bens alimentares secos distribuídos ao longo de todo o ano.

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Com o acesso aos supermercados condicionado devido ao estado de emergência, a campanha de recolha alimentar decorrerá apenas online e o presidente do Banco Alimentar de Setúbal apela à população para que “não esqueça esta forma diferente de apoiar”.

De olhar atento ao movimento do armazém, o presidente fala de uma crise social que está a ganhar grandes proporções. Para além das instituições que contactam com o Banco Alimentar já há muitos particulares que, sem conhecerem as regras, também o fazem.

Pedro Cunha, presidente da delegação de Setúbal do Banco Alimentar Contra a Fome, refere dezenas de pedidos de ajuda consequência da crise social que a pandemia está a provocar. Fotografia: MÁRIO ROMÃO

“Todos os dias recebemos telefonemas de pessoas desesperadas a pedir alimentos, desconhecendo que não doamos directamente. Essa ajuda tem de ser pedida primeiro a IPSS locais. E só depois as pessoas passam a receber apoio alimentar”, esclarece Pedro Cunha, afirmando que “é impossível ficar indiferente a todos estes casos”.

Isabel Jonet, presidente da Federação Portuguesa dos Bancos Alimentares, referiu recentemente que, em apenas duas semanas, chegaram aos Bancos mais 9 200 pedidos de apoio alimentar, dos quais cerca de 4 500 são de pessoas residentes nas regiões de Lisboa e Setúbal. Um número “impressionante”, indicador da perda de autonomia alimentar, “na maior parte dos casos devido ao desemprego”.

Aliás, os últimos dados publicados pelo Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério do Trabalho indicam a maior subida do nível de desemprego de sempre, com 31 955 novos inscritos no Instituto de Emprego e Formação Profissional, nas duas primeiras semanas de Abril.

 

Voluntariado (quase) a tempo inteiro

Enfermeiro militar, aos 67 anos Corte Graça encontrou no voluntariado uma missão humanitária. Fotografia: MÁRIO ROMÃO

Corte Graça é voluntário na delegação de Setúbal do Banco Alimentar há nove anos. O trabalho diário “é árduo, nunca acaba e muito dias é a tempo inteiro”, mas, no fim, “deixa sempre um sentimento de humanidade, de estar a fazer algo pelos outros”, afirma o enfermeiro militar de 67 anos e que ainda prestas serviços no Hospital Militar.

“Aqui a faixa dos 60 anos é a mais presente e falta, muitas vezes, sangue novo”, aponta Corte Graça. “Mas ninguém baixa os braços à missão social que assumiu. Especialmente nesta época”.

Quando veio pela primeira vez ao Banco, Corte Graça gostou precisamente desse sentimento de missão, que sempre fez parte da sua vida enquanto enfermeiro militar e que, agora, em plena epidemia, “deve estar presente em todo país e em todos os actos de voluntariado”.

 

CASA e Criar-T sem mãos a medir

No CASA, Centro de Apoio a Sem-Abrigo, os voluntários preparam 40 refeições todas as noites para responder a pedidos de ajuda que duplicaram. Fotografia: O SETUBALENSE

 

No concelho do Seixal a ajuda dada pela Criar-T, através dos donativos recolhidos no Banco Alimentar de Setúbal, é direccionada a famílias em situação de carência económica, “mas desde que a Covid-19 começou a impor o isolamento, a instituição também estendeu o apoio a pessoas idosas que não podem sair de casa”, conta Milton Alves, monitor social na Criar-T há dezasseis anos.

Os pedidos de apoio alimentar a famílias “aumentaram entre 40% a 50%”, para além do apoio a pessoas em situação sem-abrigo que, até há um mês, conseguiam ter acesso a ajuda alimentar dentro da comunidade, através de grupos de voluntários ou da restauração local. “Agora, sem essa ajuda diária, procuram mais apoio alimentar na Criar-T”, conclui Milton Alves.

No CASA, Centro de Apoio a Sem-Abrigo, que em Setúbal tem a sua delegação no bairro da Fonte Nova, os pedidos de ajuda também duplicaram. Quando chegamos ao número 22 da Rua Ladislau Parreira dezenas de pessoas aguardam uma refeição quente e as distâncias de segurança impostas devido à Covid-19 tornam-se impossíveis de respeitar.

Esta associação recebe “algum apoio do Banco Alimentar”, explica Ana Margarida Conceição, que assume a coordenação do grupo de voluntários das quintas-feiras, “mas não chega para todos os pedidos de ajuda”. A maior parte dos donativos vêm dos voluntários que “completam com dinheiro do seu próprio bolso” o que falta para o CASA cozinhar. “Até porque antes da Covid-19 eram cerca de 20 as refeições servidas, hoje, ultrapassam as 40”.

Hoje chegam ao CASA pessoas que, até há poucos meses, tinham um quotidiano organizado, “embora com equilíbrio frágil, devido ao trabalho precário”. Agora, sem rendimentos, “resta-lhes o apoio do CASA e de outras instituições da cidade”.

 

Rui, o voluntário que hoje pede ajuda

A maior parte dos pedidos de ajuda alimentar que chegaram recentemente ao CASA são de pessoas que perderam o emprego devido à Covid-19. Fotografia: O SETUBALENSE

Rui (não quer ser identificado por apelido) faz parte dos que chegaram recentemente, depois de o trabalho desaparecer devido à Covid-19. “Até há pouco tempo eu tinha o meu trabalho, mesmo precário. E, até há um ano, o voluntário era eu”, conta.

Participou em muitas actividades do projecto “Nosso Bairro, Nossa Cidade”, que une cinco bairros sociais de Setúbal, mas a “crise da Covid-19”, como lhe chama, e o desemprego levaram-no a procurar ajuda.

Rui tem a certeza de que “tudo isto é temporário” e que vai retomar a sua vida. “Até lá, é muito doloroso, todas as noites, estar à porta do CASA, a contar com a ajuda de pessoas incansáveis, só para não ter fome”.

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