Uma crise pandémica não pode ser pretexto para aprofundar as desigualdades sociais

Uma crise pandémica não pode ser pretexto para aprofundar as desigualdades sociais

Uma crise pandémica não pode ser pretexto para aprofundar as desigualdades sociais

8 Abril 2020, Quarta-feira
Sandra Cunha

A crise pandémica do Covid19 apanhou-nos de surpresa, impondo às famílias e aos serviços públicos essenciais uma pressão inesperada e desafios exigentes à economia e ao trabalho. Atravessamos uma crise sanitária, social e económica como nunca antes vivemos.

Mas em tempos de pressão e incerteza revela-se o melhor dos seres humanos. Os exemplos de solidariedade vêm dos quatro cantos do mundo e Portugal não é exceção. Formal ou informalmente, num instante a sociedade se organizou em redes de solidariedade para olhar pelos mais vulneráveis. Os jovens oferecem-se para ir às compras aos mais idosos, montam-se redes de angariação de fundos para famílias carenciadas ou pessoas sem-abrigo, empresas e laboratórios adaptam-se às novas necessidades e produzem materiais de proteção individual para o SNS e para os profissionais que combatem o vírus na linha da frente. Enquanto sociedade, percebemos que o tempo é de unir esforços e que este combate tem de ser em conjunto.

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Ao mesmo tempo, revela-se também o pior que existe nas sociedades capitalistas. Há sempre quem no meio do caos não só não tem qualquer interesse em contribuir para este esforço conjunto como não hesita em aproveitar-se da situação para benefício próprio. São, sem surpresa, as grandes empresas com maior capacidade financeira, que ano após ano distribuem lucros de milhões pelos acionistas, quem mais aproveita a situação para manter o seu capital financeiro intacto e aumentar o fosso das desigualdades sociais preparando o terreno para a diminuição do custo do trabalho.

Do recurso massivo ao layoff, solução proposta pelo governo, mas que reduz o rendimento dos trabalhadores e coloca a Segurança Social a pagar, aos despedimentos de trabalhadores precários, da pressão para que os trabalhadores tirem férias no período de isolamento ou para que continuem a trabalhar mesmo quando a empresa recorreu ao layoff, as estratégias são várias.

No distrito de Setúbal, não faltam exemplos de quem, no meio de uma crise com impactos sociais e económicos devastadores, não olha a meios para acumular lucro, mesmo que isso se faça à custa da vida de milhares de trabalhadores e das suas famílias.

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Várias empresas do Parque Industrial da Autoeuropa iniciaram processos de layoff e de despedimento generalizado de trabalhadores com contrato temporário.

As empresas Martifer e CMN do consórcio da GALP na Refinaria de Sines iniciaram igualmente processos de despedimento de trabalhadores contratados, mesmo depois de, em 2019, o presidente executivo da GALP, Carlos Gomes da Silva, ter tido um aumento de 1,8 milhões de euros na sua remuneração, e de a GALP ter registado lucros na ordem dos 560 milhões de euros.

Também a empresa Visteon em Palmela e a LAUAK, multinacional francesa do setor aeronáutico, optaram por cessar os contratos dos trabalhadores com contrato de trabalho temporário e por não renovar os contratos a termo.

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O Grupo Multiauto aliciou os trabalhadores a assinar documentação para entrar em layoff parcial, mas mantendo horários de trabalho de 40 horas semanais. Ou seja, a empresa, com o pretexto de manter os postos de trabalho, pretende ser financiada pela segurança social, para pagar parte dos salários aos trabalhadores que mantém a laborar a tempo inteiro.

Não surpreendem estas estratégias do capitalismo desenfreado. Cabe ao governo garantir as condições de vida das pessoas, e isso faz-se através da garantia da manutenção do trabalho. A resposta à crise económica tem de caucionar a proibição dos despedimentos, incluindo a dos trabalhadores precários. Os apoios às empresas têm de ter como condição a manutenção de salários e postos de trabalho e a reintegração dos trabalhadores despedidos no início da crise, tal como já fizeram outros países, como Espanha e Itália.

Uma crise pandémica, social e económica não pode ser pretexto para enriquecer à custa dos outros, para o atropelo de direitos ou para o aprofundamento das desigualdades sociais.

 

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