Estudo prévio inclui prédio que LASA e PS consideram uma barreira. Presidente da câmara, André Martins, sublinha que a consulta pública que termina esta quarta-feira é apenas sobre os limites do Estudo de Impacte Ambiental. O urbanismo será decidido mais tarde, no plano de pormenor
A consulta publica sobre a Proposta da Definição de Âmbito (PDA) do Estudo de Impacte Ambiental (EIA) para a futura marina de Setúbal, que termina esta quarta-feira, está a suscitar polémica, com a Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA) e o PS Setúbal a considerarem que a cércea de um edifício, de 15 pisos, previsto no projecto é uma barreira arquitectónica.
O prédio, destinado a um hotel, ficará na zona central da marina, junto ao rio, no local onde está hoje o Clube Naval Setubalense, e, para a LASA, é necessário reduzir a cércea desse edifício.
“A altura projectada para esse imóvel, 15 pisos, cria uma barreira permanente entre a cidade e o rio, não respeitando o perfil urbano ideal, escalonado da serra [da Arrábida] para a Baía (clube das mais belas baías do mundo), não assegurando a democratização do direito à fruição da paisagem e estabelecendo um corte abrupto e definitivo com a escala do Centro Histórico, suas referências culturais e urbanas no perfil da imagem da cidade.”, refere o parecer da LASA sobre o projecto.
A associação, que tem estatuto de interesse público e de organização não governamental de ambiente (ONGA), recorda que “a Avenida Luísa Todi conta, infelizmente, com dois casos disruptivos até hoje impossíveis de integrar física e afectivamente na cidade”, referindo-se a dois prédios mais antigos que, pelas suas dimensões, se destacam na paisagem urbana.
Embora reconheça “a necessidade de requalificação da frente ribeirinha de Setúbal”, a LASA defende “pressupostos distintos dos apresentados” e sublinha que o empreendimento ficará localizado na zona de dois edifícios classificados – o Baluarte do Livramento, da linha de muralhas do Século XVII, e edifício da Segurança Social – numa zona “da mais elevada relevância histórica, urbanística, paisagística, identitária, e económica da cidade”, pelo que as “intervenções levadas a cabo neste espaço deverão ser cuidadosamente ponderadas pelos setubalenses.
A associação apela, por isso, à participação dos cidadãos na consulta pública, que começou a 24 de Julho e que termina esta quarta-feira, dia 14 de Agosto, que está a decorrer no site Participa e conta, até agora, com 95 participações.
No caso da LASA, as preocupações estendem-se a ainda a outros aspectos, além da altura do hotel. A associação não está convencida, também, quanto à localização e à dimensão da marina, que considera excessiva. “Os pressupostos constantes dos objectivos do projecto ‘promoção de uma maior e melhor relação entre a cidade e o rio’ não estão fundamentados”, conclui o parecer da associação, assinado pelos presidentes da direcção, Joaquina Coelho Soares, da assembleia geral, Helena Fragoso de Mattos, e do conselho fiscal, Pedro Moniz Borba.
A futura marina no estuário do Sado vai ser construída na área actualmente ocupada pela doca do Clube Naval Setubalense, situada na frente ribeirinha e na zona central da cidade de Setúbal.
O estudo prévio, que foi apresentado pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) aos eleitos locais, em 2022, indica que a marina de Setúbal vai ter capacidade para acolher 600 embarcações, incluindo iates de grandes dimensões (50 metros).
Na Proposta de Definição de Âmbito (PDA), a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), que é a entidade coordenadora da consulta pública, refere que o projecto, promovido pela APSS, “não se encontra inserido em qualquer Área Protegida ou Sítio Classificado da Rede Natura”.
A CCDR-LVT salienta, no entanto, que, na sua proximidade, é de assinalar a “presença de áreas sensíveis do ponto de vista da conservação da natureza” e que, relativamente ao património classificado ou em vias de classificação, através da consulta ao Atlas do Património, alojado no site Património Cultural, verifica-se a “presença na área de intervenção e sua envolvente próxima [de] património classificado”.
O projecto é apresentado pelo promotor, a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, como um objectivo estratégico. “Uma marina com condições de excelência para o acolhimento de um maior número de embarcações e de uma série de serviços de qualidade” contribui para o desenvolvimento da actividade do turismo náutico, frisou Carlos Correia, presidente da APSS, em Novembro de 2022 quando foi apresentado o estudo prévio.
Presidente da câmara explica que pormenores do projecto ainda vão ser definidos
Embora a marina de Setúbal esteja já prevista no novo Plano Director Municipal (PDM), o projecto concreto tem ainda de ser enquadrado num Plano de Pormenor a elaborar e aprovar pela câmara municipal pelo que, refere o autarca Andre Martins, esta consulta pública não é ainda sobre as questões apontadas pela LASA.
“Neste momento o que está em consulta pública é o impacte ambiental da área de delimitação proposta”, diz o presidente do município, acrescentando que “fica já o registo da questão que colocam, para consultas sobre estudos e projectos posteriores”.
Em declarações a O SETUBALENSE, André Martins diz que “a questão que levantam há-de vir a ser considerada no âmbito do plano de pormenor que terá lugar mais à frente, quando avançar o projecto da marina, que também terá discussão pública”.
O autarca louva o papel cívico da associação e a oportunidade do apelo à participação na consulta pública. “Não há dúvida de que toda a frente ribeirinha é uma área de grande sensibilidade e por isso é importante participar em todos os momentos e fases de desenvolvimento deste grande projecto. E há que salientar o facto de a LASA estar atenta e sempre disponível para participar e colaborar sobre matérias de grande importância para as pessoas e para o território, como é o caso.”, conclui o presidente da Câmara de Setúbal.
PS atira-se ao projecto: “mais do que uma barreira, é uma aberração”
O PS Setúbal defende a necessidade de uma marina em Setúbal mas diz que o projecto que foi apresentado “cria uma barreira efectiva nesse acesso e nessa vivência” numa extensão, entre o Cais 3 e a lota, que, ao partido, “parece excessiva”.
Em comunicado enviado a O SETUBALENSE no final da reunião de câmara desta quarta-feira, os vereadores do PS acrescentam que “a solução mais equilibrada seria limitar a marina à frente de rio compreendida entre o edifício dos pilotos/ICNF e a lota, libertando para fruição da população toda a frente do Cais 3 e do jardim da beira-mar”.
Sobre o hotel, que além dos 15 pisos à superfície terá mais dois subterrâneos, num total de 17 andares, os socialistas mostram-se frontalmente contra. “Esta proposta é mais do que uma barreira, é uma aberração, um verdadeiro atentado urbanístico que descaracteriza a frente ribeirinha e a cidade”, afirmam os vereadores rosa.
Apesar das criticas aos projecto, os eleitos do PS querem uma marina em Setúbal, uma infra-estrutura que classificam como transformadora “não só da frente ribeirinha e de toda a sua envolvente urbanística, mas também do tecido económico da cidade” porque “permitirá também a criação de novas empresas e de postos de trabalho especializados, e enquanto nova centralidade deste território, irá
necessariamente impulsionar a revitalização do centro histórico”.
“A criação de uma marina é um desejo antigo da cidade e dos setubalenses, mais do
que uma ambição, é uma necessidade”, afirmam os vereadores do PS.