Cesaltina Catarino viajou, à pressa, para Lisboa, para assistir de perto aos acontecimentos do dia 25 de Abril de 1974. Recorda que a festa que se seguiu durou dias. “Para mim, ainda hoje é motivo de festa”, exclama
Cesaltina Catarino sempre preservou a sua liberdade e, como tal, assim que soube da Revolução, pela rádio, apressou-se na tentativa de “fazer parte deste grande acontecimento”.
Apesar dos avisos para ficar em casa, ela queria sair. Não tinha carro, por isso, teve de ir à casa mais próxima: “Tive de pedir o carro emprestado ao meu vizinho, na altura, e ele, em vez de me dar as chaves, levou-me até Lisboa”, este foi um gesto que Cesaltina nunca esqueceu: “tinha falado duas ou três vezes com ele e, de repente, tornamo-nos amigos”.
Fizeram-se à estrada, a viagem que durou algumas horas, parecia “interminável”. À medida que passavam pelas cidades [ainda não havia Ponte Vasco da Gama], em plena madrugada, viam pessoas a celebrar “em êxtase”, as ruas preenchiam-se de felicidade e euforia, no final de contas, este seria o dia que vinha a mudar a vida de todos os portugueses.
Quando chegaram a Lisboa, já era de dia e “só se via ambulâncias a passar” e ainda mais pessoas na rua. Cesaltina e Adelino, nome do vizinho que a acompanhou nesta jornada, abrigaram-se durante várias horas na casa de uma amiga: “Chegámos a Sacavém e, lá em casa, estava tudo maluco a festejar, mas ao mesmo tempo não queriam ir até às manifestações [suspira] achavam que era perigoso”.
Ninguém os deixou sair de casa e foram então “obrigados” a acompanhar a Revolução pela rádio. “Já estava farta daquela marcha”, afirma a Cesaltina, referindo-se à marcha do Movimento das Forças Armadas (MFA) que passava entre os comunicados. Devido a esta inquietação, os dois vizinhos ignoraram os conselhos que lhes foram dados e aventuraram-se pelas ruas de Lisboa.
“Até hoje não sei bem como é que chegámos ao Quartel [do Carmo]”. Por esta altura, “já estava exausta [pausa] tinha sido uma noite agitada, mas aquilo que senti quando lá cheguei acordou- -me de uma maneira inexplicável” conta Cesaltina, com os olhos em lágrimas.
Embora não estivessem na linha da frente, conseguiam sentir toda a excitação e entusiasmo que pairavam no ar: “as pessoas abraçavam-se só porque sim”, relembra a rir-se. Ouviam, atentamente, todos os comunicados e actualizações. “De longe, não percebíamos bem o que se estava a passar então tínhamos que ouvir pela rádio”.
Cesaltina recorda o momento em que foi anunciado que Marcelo Caetano se tinha rendido: “já estávamos no final da tarde [pausa] foi uma explosão de alegria como nunca vi”.
‘Tina’ teve de voltar de imediato para Alcochete, mas a festa não parou por aí. Quando chegou viu que o clima era praticamente o mesmo e que não havia sinais de que fosse abrandar: “A festa durou dias e dias [pausa] para mim, ainda hoje é motivo de festa”.
Daniel Ferreira e Iara Silva * Texto publicado na edição especial da revista ‘PerfiLocal’, da ESE-IPS