O tenente Ramiro Soares Rodrigues era o oficial de serviço na fragata Sacadura Cabral, o vaso de guerra que podia ter travado o 25 de Abril. Garante que não inventou uma avaria, como ficou para a história, porque a falha que impediu a o navio de sair do Alfeite existiu realmente
Ramiro Soares Rodrigues, na altura primeiro-tenente, era o oficial de serviço da fragata Comandante Sacadura Cabral, na Base Naval do Alfeite, em Almada, no dia 24 de Abril de 1974. Tendo pertencido a alguns grupos, a que chama “secretos”, estava por dentro das conspirações que aconteciam regularmente entre os oficiais, no entanto, “não sabia se [a Revolução] seria no dia 23, 24 ou 25”.
No dia 24, “disseram-me: “Vê lá se ‘tás com atenção, que hoje é capaz de haver aí alguma coisa.”. Percebeu imediatamente que poderia ser o dia em que a sua vida mudaria para sempre, ainda assim, foi dormir.
“Eu estava num navio com um sistema de electrónica muito actualizado e disse ao pessoal que ia dormir na cabine e se acontecesse algo para me irem acordar”, recorda.
Durante a Revolução manteve sempre a mesma posição, à qual chamava “neutralidade activa”. Defendia que a Marinha deveria estar sempre do lado do exército. “A preocupação da Marinha era que nenhum navio, a arma de excelência da Marinha, se opusesse ao movimento dos capitães e que fizesse, fosse o que fosse, para neutralizar as suas forças”.
O Capitão de Abril afirma que ao contrário daquilo que é, muitas vezes, noticiado “não inventei avaria nenhuma”. A fragata Sacadura Cabral não saiu do Alfeite, e arruinou a oposição armada à Revolução, devido a uma avaria relacionada com o combustível e não por invenção do Tenente, uma grande e feliz “coincidência”. Informado pelo oficial de serviço, o comandante do vaso de guerra aceitou as explicações e o navio manteve-se fundeado.
Soares Rodrigues desvaloriza a importância da sua intervenção no golpe, afirmando mesmo que “há histórias muito mais engraçadas e muito mais importantes do que a minha”.
Apesar de tudo, é difícil pensar que a Revolução teria corrido da mesma forma se o ocial de serviço, naquela madrugada, não fosse o tenente Ramiro Soares. O Capitão acredita que “não há guerras que levem a lado nenhum” e enaltece os modos pacícos em que ocorreram os acontecimentos da Revolução pois, ao contrário de outras revoluções, esta teve uma abordagem essencialmente estratégica.
Para além disto, acredita que “a Revolução é consequência do povo da rua”, visto que, tanto os militares que estavam com o MFA, como os que estavam do lado do regime, ao verem centenas de pessoas na rua, evitaram disparar qualquer tipo de munição.
Soares Rodrigues sublinha, ainda, a importância do domínio dos meios de comunicação, como “a televisão, o Rádio Clube Português e a Emissora Nacional”, no desencadeamento da Revolução.
“A partir do momento em que a gente tirou a comunicação ao inimigo, já foi um trunfo bastante grande”, sustenta.
Para Ramiro Soares Rodrigues, o 25 de Abril significa uma “abertura”. “É como se tivesse sido aberta uma porta [pausa] até mesmo para criticar [risos]”, conclui.
Daniel Ferreira e Iara Silva * Estudantes de Jornalismo da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal